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Um devir para si mesmo*

                                                  A filosofia também se destaca pela estranheza na relação do sujeito com o cotidiano de suas representações. Na filosofia clínica acontece algo semelhante, por exemplo, no processo inicial da terapia, e bem depois, em seus desdobramentos, onde o filósofo não possui uma metodologia apriorística, o que se conhece, se conhece pela primeira vez. Possui, dentre outros fundamentos, uma hermenêutica filosófica, que lhe possibilita um acolhimento compreensivo do outro diante de si mesmo.  Esse instante preliminar pode ser decisivo para a continuidade da clínica, pois cabe ao filósofo, além de cuidar do partilhante, cuidar de sua própria estrutura de pensamento nessa interseção. Noutras palavras, observar e sentir sua estrutura observando e sentindo o fenômeno partilhante diante de si, estabelecendo uma clarividência sobre os desdobramentos da terapia.   Em filosofia clínica a natureza dos encontros é de um saber que não sabe. Para

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Não se pode adivinhar como uma palavra funciona. É preciso que se veja a sua aplicação e assim se aprenda" "A intenção está entalhada na situação, nos costumes e instituições humanas" "(...) entender é uma vivência específica, indefinível" "Usar uma palavra sem justificação não significa usá-la indevidamente" "A língua é um labirinto de caminhos. Você vem de um lado, e se sente por dentro; você vem de outro lado para o mesmo lugar, e já não se sente mais por dentro" "(...) Não existe um método em filosofia, o que existe são métodos, por assim dizer, diferentes terapias" "Acredita-se estar indo sempre de novo atrás da natureza, e vai-se apenas ao longo da forma pela qual nós a contemplamos" "Pode-se dizer que o conceito 'jogo' é um conceito de contornos imprecisos. Mas um conceito impreciso é, por acaso, um conceito? - Uma fotografia desfocada é, por acaso, o retrato de u

Amar é uma conquista*

Amar não é uma ingenuidade da confiança porque o amor não é inocente, é consciente e livre. Não é difícil convir que quem já é capaz de amar é porque transcendeu muitas prisões tão presentes nas ilusões das vaidades, das espertezas, do individualismo, dos medos, da opressão, da posse, dos orgulhos e do egoísmo, sobretudo. Quem já é capaz de amar antes de mais nada, sabe respeitar as diferenças e as decisões alheias visando o bem comum, por exemplo. Amar é sim um ato de coragem e provavelmente a maior de todas as revoluções íntimas que teremos a oportunidade de experimentar nessa jornada existencial tão instigante e desafiadora. Amar é uma conquista tão grandiosa de nós mesmos que quase sempre coincide com a descoberta de um poder incomum para o perdão, para a compaixão e para a solidariedade. Afinal, amar é em grande medida uma intencionalidade crescente para que o bem viver e a felicidade habite e se estenda cada vez mais para muito além de nós mesmos. Musa! *Prof.

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"O artista livre cria sem receber encomenda. Parece que o que o caracteriza é a completa independência de seu trabalho criativo, o que, por isso, lhe confere, mesmo socialmente, as feições características de um excêntrico, cujas formas de vida não podem ser mensuradas de acordo com as massas que obedecem aos costumes públicos" "O verdadeiro problema da compreensão aparece quando, no esforço de compreender um conteúdo, coloca-se a pergunta reflexiva de como o outro chegou à sua opinião. Pois é evidente que um questionamento como este anuncia uma forma de alteridade bem diferente, e significa, em último caso, a renúncia a um sentido comum" "(...) pode-se compreender tudo sobre o que se tem interesse, somente se reconhecermos 'historicamente' o espírito do autor, isto é, superando nossos preconceitos, não pensamos noutras coisas do que nas que o autor pôde ter em mente" "(...) compreender significa, de princípio, entender-se uns

Recortes Vertiginosos de um diário Pessoal*

Hortêcias e Ciprestes emolduravam a pose do arqueiro infante... e diante da visão do sorriso vago aberto e largo daquele homem que plainava sob meus olhos descrentes! De minha onírica miopia via aves transparentes no arfar de mais uma primavera. E a primasia da perda mais forte se fazia após a mesa posta de entreamigos... Surpeendida ao fim da tarde com sua voz a ofuscar toda e qual quer outra imagem escolhi um passo médio para o encontro. Outra queda e de mais alto lugar...   trafegam tristes esperanças por vales demasiado sedimentados e irresponsáveis sabemos bem do amanhã que não há, enquanto cheiramo-nos em desespero!!! Numa urgente tentativa de carnal fusão escândalos no botequim ao som da queda do extintor lábios úmidos, carmim e uma tosca expulsão...   à praça deserta aplacar de aflições em obscuro sanitário e etílicas vãs investidas... daí pra frente um ensaio: arremedo de vida que sabíamos

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Toda ideia tem um espaço e um tempo - e alguém que ali se move inseguro" "(...) eu diria que minha atividade artística, isto é, aquilo que criamos num impulso não solicitado pelos outros, para neles nos reconhecer, nasceu como simulacro da realidade" "Estamos condenados à nossa experiência (...) todo desejo de reprodução (...) estará condenado ao fracasso. A evocação tem de criar o seu próprio sentido, que é um novo acontecimento (...) um evento inédito que nasce sobre as ruínas do passado (...) o ato de escrever é um evento, não uma reprodução" "(...) para o escritor solitário, o desejo de agradar é provavelmente mais uma intuição narrativa que se mistura em graus diferentes com uma intenção pessoal" "É provável que todo escritor trabalhe em graus diferentes de entrega, atendendo a um e outro leitor, em ondas sutis, talvez mais pelo acaso da criação que por uma suposta consciência determinante ou uma escolha objetiva&q

Convite a reflexão*

A inteligência de um intelectual de esquerda não tem dono: nem partido, nem igreja, nem Estado podem fazê-la se comportar. O intelectual de esquerda não confia totalmente nem mesmo nas razões da sua própria consciência, porque sabe que não existe uma consciência pura - ela é, em grande medida, condicionada pelas suas circunstâncias históricas, materiais e culturais. Por isso, o intelectual de esquerda coloca tudo em questão, desconfia de todas as idéias, escapa das cercas que protegem o rebanho. Assim, definir-se como intelectual de esquerda e colocar a sua inteligência a serviço de um partido político, de uma igreja ou de um Estado é contraditório: é o mesmo que afirmar a sua liberdade - mas a liberdade de permanecer no cativeiro. *Prof. Dr. Gustavo Bertoche Filósofo. Educador. Escritor. Filósofo Clínico. Teresópolis/RJ

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"No fim das contas ninguém pode captar nas coisas, incluídos os livros, mais do que ele mesmo já sabe. Para aquilo que a gente não alcança através da vivência, a gente também não tem ouvidos" "Não é a dúvida, é a certeza que enlouquece... Mas para isso a gente tem de ser profundo, tem de ser abismo, tem de ser filósofo para sentir assim (...)" "(...) não acreditar em nenhum pensamento que não tenha nascido ao ar livre e em livre movimentação" "Quem sabe respirar o ar das minhas obras, sabe que ele é um ar das alturas, um ar vigoroso. A gente tem de ter sido feito para ele, caso contrário não é nem um pouco insignificante o perigo de se resfriar no contato com ele" "A filosofia, assim como a entendi e vivenciei até agora, é a vida espontânea no gelo e nas montanhas mais altas - a procura de tudo que é estranho e duvidoso na existência, de tudo aquilo que até agora foi excomungado pela moral" "(...) foi o pró

O Tempo Outro*

“Não há outro tempo que o agora, este ápice Do já será e do foi, daquele instante...” Jorge Luis Borges (O passado) Ao descobrir o que há por detrás daquela parede, descubro o outro lado, ao descobrir o outro lado, busco o que existe dentro de mim, o desconhecido. Vivemos trancafiados no mundo real, ideias desviam-se dos acontecimentos. O Real nos deixa mais vulneráveis às extremidades da mente, fazer o resumo das coisas, viver a realidade que inventaram, forjar outra. A tentativa de viajar no Outro é a busca de si no que há de diferente no tempo presente; ao passado, a tentativa de olhar com os olhos livres da realidade, que se afirmaram por estar indo ao futuro. A engrenagem, dizia Sartre. Digo, reatividade, se o tempo é descontínuo, Levinas estaria a me levar ao descontínuo do tempo que constitui a reserva das ideias sobre o Tempo. Pensar e viver o tempo, como o filósofo pergunta, por que é preciso ir para o bem, o mal, a evolução, as fraturas, as separações? Por est

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Para aquele que se eleva, o horizonte se alarga e se ilumina. O horizonte é para ele a imensa auréola da terra contemplada pelo ser elevado; que essa elevação seja física ou moral, pouco importa. Quem vê longe tem o olhar claro, seu rosto se ilumina, sua fronte se aclara" "Aprendemos a sonhar o texto que a crítica clássica se limita a compreender, e finalmente a negligenciar" "Todo verdadeiro poeta que contempla o céu estrelado ouve o curso regular dos astros. Ouve 'os coros aéreos', a noite, a doce noite que caminha" "Para ouvir os seres do espaço infinito, é preciso silenciar todos os ruídos da terra" "(...) a imaginação é o princípio de uma eterna juventude. Rejuvenesce o espírito devolvendo-lhe as imagens dinâmicas primeiras" "Para a vida que se vê, para o movimento que se desdobra, basta a prosa. Só os poemas podem trazer à luz as forças ocultas da vida espiritual" "Mais profunda

A palavra mundo*

      "As palavras são instrumentos de atos úteis, de modo que nomear o real é cobri-lo, velá-lo com familiaridades. (...) Para rasgar os véus e trocar a quietude opaca do saber pelo espanto do não-saber é preciso um 'holocausto das palavras'."                                                                Jean-Paul Sartre Uma poética se anuncia num esboço de captura às múltiplas verdades. Nesse horizonte nem sempre coerente, a pessoa encontra um chão para integrar-se e experienciar suas possibilidades existenciais.      Ao ser a visão de mundo inseparável da subjetividade que a oferece, as formas da expressividade tentam obter o maior ângulo possível. Nela o teor dos termos agendados denuncia até onde se pode chegar. Um pouco antes dos movimentos de rebeldia, a linguagem, em vias de se ultrapassar, costuma emitir dissonâncias. Uma dessas características é o excesso de equivocidades discursivas, as quais, nem sempre se traduzem ao dicionário conhecido.  

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Dado que os novos paradigmas nascem dos antigos, incorporam comumente grande parte do vocabulário e dos aparatos, tanto conceituais como de manipulação, que o paradigma tradicional já empregara. Mas raramente utilizam esses elementos emprestados de uma maneira tradicional. Dentro do novo paradigma, termos, conceitos e experiências antigos estabelecem novas relações entre si" "(...) experiências que, ao evocarem crises, preparam caminho para uma nova teoria" "Qualquer nova interpretação da natureza, seja ela uma descoberta, seja uma teoria, aparece inicialmente na mente de um ou mais indivíduos. São eles os primeiros a aprender a ver a ciência e o mundo de uma nova maneira. Sua habilidade para fazer essa transição é facilitada por duas circunstâncias estranhas à maioria dos membros de sua profissão. Invariavelmente tiveram sua atenção concentrada sobre problemas que provocam crises. Além disso, são habitualmente tão jovens ou tão novos na área em c

Estrelas e jardins*

A estrela cadente Trazia lembranças pendentes Dos bem-quereres que vivera Que caíram no esquecimento Iguais aquelas estrelas Se apagando no firmamento E agora ela decidira Não mais se apaixonar Daquele mesmo modo Meio tonto, meio torto Sem jeito... Agora cultivaria jardins Plantaria flores De todas as cores E esperaria a visita Das leves borboletas Brincaria com as letras Na costura da sua vida.! *José Mayer Filósofo. Livreiro. Poeta. Especialista em Filosofia Clínica Porto Alegre/RS

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Mal defino, contudo, este enigma a que sirvo, apesar do longo convívio com o fazer literário. Sempre que tentei esclarecer os postulados da arte narrativa, falhei em apreender sua vasta relação com o mundo e os seres. Sei, no entanto, que a escritura é a residência secreta do escritor na terra"  "Inexperiente perante os variados e infinitos sistemas verbais, crescia-me a certeza de que as palavras me desgovernavam, eram mais fortes que eu. Em especial porque significavam inúmeras coisas ao mesmo tempo, segundo os significados que lhes desse" "(...) Persuadiam, a quem fosse, que a narrativa não desapareceria com eles e nem comigo. E não se desvanece tão pouco diante da desatenção geral. Sua chave mestra é disseminar encantos e perplexidades" "Tal poética, em formação, rendia frutos. Desaparelhava obstáculos iniciais, reduzia os preconceitos mentais e emocionais expedidos pelo lar e pelos compêndios escolares, acautelava-se contra as p

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