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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Se o poeta é sempre 'algum outro', sua poesia tende a ser igualmente 'a partir de outra coisa', a encerrar visões multiformes da realidade na recriação singularíssima da palavra" "Todo leitor da obra completa de Keats - e de suas admiráveis cartas - observará que o périplo do poeta não o levou além de si mesmo, de suas próprias crenças reiteradamente sustentadas antes e depois de escrever a Ode" "Os poetas se compreendem de poema a poema melhor do que em seus encontros pessoais" "Com Antonin Artaud calou na França uma palavra dilacerada que só esteve pela metade do lado dos vivos enquanto o resto, partindo de uma linguagem inalcançável, invocava e propunha uma realidade vislumbrada nas insonias de Rodez" "Viver importa mais do que escrever, a anão ser que o escrever seja - como tão poucas vezes - um viver" "O surrealismo propõe o reconhecimento da realidade como poética" "Se s

Relacionamento Sério*

                                                         Tenho pena das pessoas que estão num relacionamento sério. Não sei se a palavra pena seria a mais adequada, talvez fosse melhor dizer que lamento saber que entre tantas opções, escolheram entrar justo numa relação deste tipo. E fica pior ainda, quando estas mesmas pessoas orgulhosamente compartilham seu status na mídia social - #em um relacionamento sério#. Relacionamentos sérios são cautelosos, vigilantes, sisudos. Envolvem posse, ciúme, cobrança, julgamento, competição para saber quem é mais inteligente, mais esperto, mais esclarecido. Uma guerra sem exército, disputada dia a dia para definir quem vai mandar em quem. Não é permitido falhar, estão sempre em guarda, sempre devendo, fiscalizando, reclamando. Nunca tiram folga para se querer, desejar, amar. Nem quando estão juntos, tampouco quando se separam. Relacionamentos sérios vão se consumindo dia a dia. São contratos, acordos, fugas, silêncios, distâncias, dissim

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) esse desajeitamento acompanha muitas vezes o amor à solidão. Tendo tropeçado numa arca, Orlando gostava naturalmente de lugares solitários, de vastas perspectivas (...)" "(...) As velhas suspeitas que nele trabalhavam subterrâneas, levantaram-se do seu esconderijo, abertamente" "(...) que estranhos poderes serão esses que penetram nossos mais secretos caminhos e mudam nossos mais preciosos bens, a despeito da nossa vontade ?" "Porque a doença de ler, uma vez tomando conta do organismo, enfraquece-o a ponto de torná-lo fácil presa desse outro flagelo que habita no tinteiro e supura na pena. O desgraçado dedica-se a escrever (...)" "Orgulhava-se de que sempre o tivessem chamado de literato, e escarnecessem de seu amor aos livros e à solidão (...)" "Quebrara, certa vez, o leque de Lady Winchilsea, procurando uma rima. Relembrando avidamente esses e outros exemplos de sua incapacidade para a vida social,

Nave corpo mãe*

Decididos a viajar pela Terra, A nave mãe nos colheu. Incubadeira experimental, Dando forma aprendemos A humanos Ser. Cada uma a seu modo Monitorou nossa ida e vinda. Nem para todos a adaptação Foi fácil, linda e bela. Aprendemos amor e desamor, Perdas e ganhos, Sensações e sentimentos. Gratidão é o que celebramos, Na jornada chamada vida, Por esta Nave Mãe De carne e osso Alegria e dor. O resto são floreios poéticos, Nem sempre tão autênticos, Pois, o que importa é o ATO Sem apego e livre. Amor é verbo vivido No desapegar e deixar florecer. *Dra. Rosângela Rossi Psicoterapeuta. Escritora. Filósofa Clínica. Livre Pensadora. Juiz de Fora/MG

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Como se visse alguém beber água e descobrisse que tinha sede, sede profunda e velha. Talvez fosse apenas falta de vida: estava vivendo menos do que podia e imaginava que sua sede pedisse inundações (...)" "A violeta é introvertida e sua introspecção é profunda. Dizem que se esconde por modéstia. Não é. Esconde-se para poder captar o próprio segredo. Seu quase-não-perfume é glória abafada mas exige da gente que o busque. Não grita nunca o seu perfume. Violeta diz levezas que não se podem dizer" "Corro perigo como toda pessoa que vive. E a única coisa que me espera é exatamente o inesperado" "Quanto à música, depois de tocada para onde ela vai ?" "(...) já lera biografias de pessoas que de repente passavam a ser elas mesmas e mudavam inteiramente de vida, pelo menos de vida interior" "Toda a parte mais inatingível de minha alma e que não me pertence - é aquela que toca na minha fronteira com o que já não é e

O tempo das águas*

     “[...] em virar a cabeça para ver as trilhas que foram percorridas; é um produto da reflexidade.”                                                                 Paul Veyne Como já dizia o pensamento: O dia nublado fecha os olhos dos que não sonham. O dia abre a mente dos sonhadores. Entregue ao tempo a recusa do medo atroz, e o desejo desfaz a solidão do medo arrebatador. O dizer nas águas que bate forte, o sopro do dia, o vento que destrói a longa jornada do tempo. Depois de tudo, o corpo em frente ao rio sem fim, tal qual guerreiro no despertar da vida, mesmo sabendo da morte, enfrenta a escuridão do ódio contra o que se refugia no pátio abandonado dos tempos sombrios. O corpo se mantém lá. Parado. O pensamento a voar, dor e o frio tocam a música da infância abandonada no rio de águas pesadas. O corpo retesado, na vertical da vida, os braços em movimentos, frágeis e decididos. A dor é o devaneio que toma conta de todos esses anos que aos po

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) a maneira de ver as coisas muitas vezes tem um papel decisivo. Certas coisas parecem perigosas, impossíveis, ou nocivas simplesmente porque existem maneiras de vê-las por essa prisma" "Mana é um poder medicinal ou curativo, que existe em toda parte, fertiliza o homem, o animal e a planta, e dá força mágica ao chefe da tribo e ao curandeiro. O conceito de Mana identifica-se com algo de 'extraordinariamente eficaz', como prova Lehmann, ou é pura e simplesmente aquilo que impressiona. Portanto, tudo o que impressiona é 'medicina' na escala primitiva" "As contradições em qualquer ramo da ciência comprovam apenas que o objeto da ciência tem propriedades, que por ora só podem ser apreendidas através de antinomias" "(...) a psicoterapia não ser um método simples e evidente, como se queria a princípio. Pouco a pouco foi-se verificando que se trata de um tipo de procedimento dialético, isto é, de um diálogo ou discussão

A palavra mágica*

                                           “Vive a tua hora como se gravasses o teu nome na epiderme de um tronco novo. Mas não voltes mais tarde para junto dessa árvore, porque podes não reconhecer o teu nome nas cicatrizes das velhas letras.”                                                                      Felippe D’Oliveira Sua tez de singularidade maldita refere uma simbologia em viés de encantamento. Na veemência discursiva compartilha uma fatia generosa de paraíso. O sagrado_profano esboça uma íntima convivência com a reciprocidade. Os significados apreciam aliar-se aos papéis existenciais de travessia. Assim o feitiço da palavra como medicamento aprecia as estruturas mutantes envolvidas na interseção.   Ao sugerir a cidade das maravilhas, é possível um novo entendimento e relação com o universo interior. Sua fonte de inspiração, muitas vezes, se faz menção em dialetos de esquiva. A magia, um pouco antes de ser representação traduzível, aprecia transbordar nalgu

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) toda forma de espírito verdadeiramente original cria a forma linguística que lhe é apropriada" "Se a linguagem, nos seus termos conceituais complexos, não constitui um reflexo da realidade sensível, mas antes um reflexo de operações do espírito, conclui-se necessariamente que este reflexo pode e deve efetuar-se de maneiras infinitamente múltiplas e variadas" "(...) Se o conteúdo e a expressão do conceito não dependem da matéria que compõe as diversas representações sensíveis, e sim da forma de sua combinação, cada novo conceito da linguagem representa uma nova criação do espírito" "A liberdade que possuía Adão quando criou as primeiras denominações para concepções complexas, não dispondo de nenhum modelo além daquele que lhe era sugerido pelos seus próprios pensamentos, esta mesma liberdade existiu e continua a existir para todos os homens" "O conceito de verdade de Hobbes culmina na tese pela qual a verdade não r

Reflexões para os dias de hoje*

Valendo-me de uma interpretação em sentido lato, há uma característica que nos constitui e que Heidegger denominou de falatório. É um traço do que o filósofo alemão chama de inautenticidade. Somos inautênticos nos momentos em que nos perdemos na coletividade. Quando o que pauta nossa existência é o que todos pensam, dizem e fazem. O falatório ocorre quando nossa ocupação consiste em falar sobre todo e qualquer "assunto do momento" (curiosidade) levando-nos a acreditar que estamos acertando quando, na verdade, falamos tanto que até emitimos sentenças contraditórias (ambiguidade), mas só percebemos as que encontraram ressonâncias na realidade. Isto acaba nos convencendo que estamos com a posse da verdade quando não passamos de tagarelas a emitir todo tipo de opinião (doxa). É inautêntico quem emite essas falas e quem segue esses faladores confiando-os seu próprio juízo. E isto é agravado porque a identificação a um grupo assim rompe com toda capacidade de reconh

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Se este livro, que não deverá sobreviver para dar lições aos pósteros, pode no entanto servir de lição a alguém, deverá então ensinar que vivemos num período de evolução acelerada: e a única palavra que a cultura deve proferir para poder defini-lo será uma palavra de recusa das definições estáveis e catedráticas" "(...) as novas obras musicais, ao contrário, não consistem numa mensagem acabada e definida, numa forma univocamente organizada, mas sim numa possibilidade de várias organizações confiadas à iniciativa do intérprete, apresentando-se, portanto, não como obras concluídas, que pedem para ser revividas e compreendidas numa direção estrutural dada, mas como obras 'abertas', que serão finalizadas pelo intérprete no momento em que as fruir esteticamente" "No fundo, a forma torna-se esteticamente válida na medida em que pode ser vista e compreendida segundo multíplices perspectivas, manifestando riqueza de aspectos e ressonâncias, sem ja

Insubstituível*

Recentemente participei de um Congresso Mágico, onde além de aprender novos truques e ilusões, discutia-se também o mercado de trabalho. Estava particularmente interessado numa palestra sobre magia na TV e em navios de cruzeiro. Não tinha a menor ideia de como as coisas funcionavam. É mais ou menos assim: se você quer trabalhar num navio, envia currículo com locais onde já se apresentou, vídeos com shows, carta de apresentação e fica aguardando e rezando para que um dia seja chamado para entrevista. Na televisão já é um pouco diferente. Um dia lhe telefonam dizendo que estão precisando de um mágico em determinado programa e lhe convidam para participar. Às vezes o convite é feito de última hora. Sabendo da divulgação que a mídia televisiva oferece, o mágico desmarca todos seus compromissos e comparece feliz da vida ao programa. Não raro, surge um imprevisto, a entrevista anterior se prolonga, uma catástrofe precisa ser noticiada, um artista famoso precisa divulgar seu novo disc

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