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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Para determinar com precisão o caráter específico de toda e qualquer forma do espírito, faz-se necessário, antes de tudo, medi-la pelos seus próprios padrões. Os critérios segundo os quais ela é avaliada e que norteiam a apreciação de suas produções não lhe devem ser impostos de fora, sendo, ao invés, indispensável que derivemos estes critérios das próprias leis básicas que determinam as suas formações" "(...) Neste sentido, cada forma nova representa uma nova 'construção' do mundo, que se realiza de acordo com padrões específicos, válidos apenas para ela" "Aquilo que na linguagem é estável e se subordina a determinadas leis, podendo, assim, cristalizar-se sob forma de regras, não passa de simples petrificação; mas é por detrás deste produto acabado que se encontram os verdadeiros atos constitutivos da formação, os atos espirituais da criação que se renovam permanentemente" "A diversidade das línguas não concerne aos sons e s

O porvir e as possibilidades*

Sem a bagagem do dia a dia Peregrina voo longe mares Experimento novos costumes Aprecio sabores diversos Observo detalhes sutis Abro as janelas da alma Danço no ritmo do tempo Sem ter que guardar o relógio Distancio das noticias Alieno-me das futilidades Agradeço as possibilidades Rendo-me ao porvir Transformo-me em pássaro Livre e solta poetizo o existir Vejo o sol nascer na Ásia E bendigo: Oxalá! *Dra. Rosângela Rossi Psicoterapeuta. Escritora. Filósofa Clínica. Livre Pensadora. Juiz de Fora/MG

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) se transformam sem cessar, como os átomos ao mesmo tempo singulares e múltiplos (...)"  "O próprio Caillois não era sempre aceito pelos especialistas oficiais. Interessava-se por coisas demais. Conservador, inovador, sempre um pouco à parte, ele não ingressava na sociedade daqueles que detêm um conhecimento aceito" "(...) Xenófanes, sem dúvida mais jovem que Heráclito (...) Platão chamava os Velhos, era um desses bardos errantes, indo de região em região e vivendo de seu canto; mas aquilo que cantava em seu canto era já o pensamento (...) aqueles que a escutavam assistiam a esse evento bastante estranho: o nascimento da filosofia no poema" "O que o perturba, então, o que lhe parece 'terrível' é, tanto na escrita como na pintura, o silêncio, silêncio majestoso, mutismo em si mesmo inumado e que faz passar para a arte o estremecimento das forças sagradas, essas forças que, através do horror e do terror, abrem o homem a re

Anotações e reflexões*

Tudo fica raso e transparente quando nos conectamos com o profundo da nossa intimidade ou de qualquer outra pessoa que possa nos proporcionar autoconhecimento e lucidez. É por isso que tanto a empatia quanto a compaixão de saber ouvir, além de poder ser um ato revolucionário, é agora, mais do que nunca, urgente, sobretudo, nesses tempos de obscurantismo e surdez endêmica. Saber ouvir significa saber sentir a dor e a alegria proveniente de você e do outro, doa a quem doer comova a quem comover. E é justamente essa mutilação do sentir que não só inviabiliza o intelecto como também extingue o bom senso, a racionalidade, a sensibilidade e qualquer possibilidade de solidariedade e colaboração. Pois, se a dor do outro não lhe toca, no mínimo, no melhor dos diagnósticos, há uma grande patologia moral instalada em você! E assim, uma vez carente do sentir, torna-se muito difícil compreender que julgar é muito diferente de discernir. Afinal, julgar sempre implica numa condena

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"A vida real caminha melhor se lhe dermos suas justas férias de irrealidade" "(...) Em nosso sono, são as lendas que sonham" "Os mitólogos amadores algumas vezes são úteis. Trabalham de boa fé na zona de primeira racionalização. Deixam pois inexplicado o que 'explicam', porquanto a razão não explica os sonhos. Também classificam e sistematizam um tanto depressa as fábulas" "O infinito, em nossos sonhos, é tão profundo no firmamento quanto sob as ondas (...). Um instante de sonho contém uma alma inteira" "Ora, em poesia dinâmica, as coisas não são o que são, são o que se tornam. Tornam-se, nas imagens, o que se tornam em nosso devaneio, em nossas intermináveis fantasias (...)"  "Quando um simbolismo tira suas forças do próprio coração, como crescem as visões! Parece então que as visões pensam" "É preciso que a íris do olho tenha uma bela cor para que as belas cores entrem em sua pupila.

A invenção da realidade*

                                                                                “(...) Somos feitos da mesma matéria dos sonhos”                                                                                                        William Shakespeare Um dia alguém sonhou essa vida que somos hoje. Tendo como inspiração uma poética dos desajustes, sua repercussão anuncia horizontes em camadas de possibilidade. Nesse intervalo de luz e sombra se refugiam múltiplos segredos.    Sua estética difusa insinua seus códigos numa língua estranha. Ao deixar rastros esparramados num cotidiano passando, aguarda um sentido para aquilo despercebido. Seu silêncio vivaz se exila nas entrelinhas da redação cotidiana. A atitude filosófica acolhe essas narrativas fora do comum. A desenvoltura da estrutura de pensamento (eixo de referência) determina a natureza e o alcance desse saber aprendiz, a fatia de mundo que lhe cabe. Dentre suas características se destaca uma aptidão multifacetada

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) os dois principais artistas da literatura norte-americana, Poe e Hawthorne, ficaram distanciados da sociedade como poucos no mundo jamais ficaram; aos olhos dos contemporâneos deveriam parecer espectrais e distantes, quase nem humanos, e seria fácil mostrar que não é menos marcante a reação que um mundo essencialmente irreal para eles produz em suas obras" " (...) no coração do homem que não se conformará jamais - se é poeta - com ser somente um homem. Por isso o poeta se sente crescer em sua obra. Cada poema o enriquece em ser. Cada poema é uma armadilha onde cai um novo fragmento da realidade (...)" "Os poetas se compreendem de poema a poema melhor do que em seus encontros pessoais" "Todo leitor da obra completa de Keats - e de suas admiráveis cartas - observará que o périplo do poeta não o levou além de si mesmo, de suas próprias crenças reiteradamente sustentadas antes e depois de escrever a Ode" "Se o poeta é

Anotações e Reflexões*

A paternidade não nos dá respostas para os problemas da vida interior. As dúvidas, o vazio, a angústia - condição inescapável da existência humana! - continuaram lá quando o meu filho nasceu. Ter trabalhado além dos limites do corpo e da alma para pagar as contas, ter enfrentado sozinho assaltantes rondando a casa de noite, ter cuidado do sofrimento de quem amo: nada disso me tornou um super-herói, nem me fez capaz de curar as minhas feridas internas, as que todo mundo carrega consigo. Um pai não deixa de ser um homem cheio de contradições ao fazer o que precisa. A paternidade não nos dá soluções. * * * A paternidade não me deu soluções, mas acabou com pelo menos uma questão - daquelas grandes - na minha vida: quando me tornei pai, a pergunta sobre o "sentido da vida" perdeu o significado. Não, eu não descobri esse sentido. A paternidade não me deu esse tipo de resposta. O que aconteceu foi diferente: a pergunta simplesmente deixou de ter importância.

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Preciso, de qualquer maneira, retornar à Rússia; aqui, estou a perder minha força para escrever, não tendo à mão o que é essencial para o meu ofício - ou seja, as atualidades russas (das quais eu retiro minhas ideias), o povo russo. A toda hora vejo-me obrigado a perguntar, a pedir, sentindo-me deslocado" "(...) A parte mais vil dessa história (...) é que tenho essa natureza exageradamente apaixonada. Em tudo, entrego-me até o extremo, em toda a minha vida nunca consegui agir dom moderação" "Fico imensamente feliz por ter descoberto que trago paciência em minha alma por tanto tempo, que não desejo as coisas materiais e não preciso de nada mais que livros e a possibilidade de escrever e de estar sozinho por algumas horas todos os dias. Esse último desejo é o que mais me angustia. Por quase cinco anos tenho estado sob constante vigilância, ou com várias outras pessoas, e nem uma hora sequer sozinho comigo mesmo" "(...) Mais uma vez, mu

Apontamentos e reflexões da prática clínica*

“Após aprender a parte teórica da filosofia clínica, começa um novo aprendizado para os que pretendem clinicar. A prática clínica é um recomeço. Cada partilhante é um início do zero. Talvez o aspecto mais filosófico da filosofia clínica seja o espanto ou admiração (θαύμας) diante da novidade apresentada em cada sessão. Tudo é novo o tempo todo. Nenhum caso se repete. Cada partilhante é singular, cada questão levada ao consultório vem com uma história particular que a constitui e com um jeito único de fazer essa experiência. O aparato teórico, quando bem estudado, apura a escuta e capacita para o cuidado” “Há certo equívoco em pensar que para todos os indivíduos o trato racional dos problemas pessoais seja suficiente para resolvê-los. Às vezes, é possível construir um tratado sobre o que se passa na vida e não dar conta de superar o incômodo – talvez sequer apareça nesse “tratado”. Também recorrer ao irracional pode não ajudar muito. Aquilo que constitui alguém de modo determina

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"A abertura para o mundo supõe que o mundo seja e permaneça horizonte, não porque minha visão o faça recuar além dela mesma, mas porque, de alguma maneira, aquele que vê pertence-lhe e está nele instalado"  "(...) o outro é o titular desconhecido dessa zona não minha" "Aparentemente, essa maneira de introduzir o outro como incógnita é a única que considera sua alteridade e a explica" "Há uma espécie de loucura da visão que faz com que, ao mesmo tempo, eu caminhe por ela em direção ao próprio mundo e, entretanto, com toda a evidência, as partes desse mundo não coexistam sem mim: a mesa, em si, nada tem a ver com o leito que está a um metro dela - o mundo é visão do mundo e não poderia ser outra coisa" "(...) não há propriamente intermundo, cada um habita apenas o seu, vê unicamente segundo seu ponto de vista" "O olhar dos outros homens sobre as coisas é o ser que reclama o que lhe é devido e que me incita a

Primeira impressão*

Cresci escutando e quase sempre acreditando no velho chavão da cultura popular “A primeira impressão é a que fica”. Segundo essa premissa, se você vai a um primeiro encontro, arrume-se bem, coloque perfume, seja agradável, interessado na conversa e suas chances de que o outro tenha uma boa impressão aumentarão bastante. Só que não. É muito difícil saber o que vai impressionar o outro e, mais ainda, a primeira impressão, seja lá qual for, apesar de ser importante, nem sempre é confiável e não precisa ser definitiva.   O cérebro humano foi programado para analisar em questão de milésimos de segundo se está frente a uma situação de perigo. Quando um desconhecido se aproxima, automaticamente inicia o processo de reconhecimento, chegando a conclusões rápidas com muito pouca informação. Avalia ameaças instantaneamente, levando em conta sentimentos, memórias, experiências, personalidade e necessidades. Isto é o que chamamos de primeira impressão, um recurso adaptativo com a finalidade

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Eu, alquimista de mim mesmo. Sou um homem que se devora ? Não, é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus" "(...) Mas para se experimentar uma surpresa é necessário que a rotina dos hábitos e manias seja por qualquer motivo suspensa" "O principal a que eu quero chegar é surpreender-me a mim mesmo com o que escrevo. Ser tomado de assalto: estremecer diante do que nunca foi dito por mim" "(...) E se eu falar, que eu me permita ser descontínuo: não tenho compromisso comigo. Eu vou me acumulando, me acumulando, me acumulando - até que não caibo em mim e estouro em palavras" "Sou como estrangeiro em qualquer parte do mundo. Eu sou do nunca" "Acho que loucura é perfeição. É como enxergar. Ver é a pura lo

Anotações e reflexões*

Uma ex-aluna, Danielle Christine, estudante de Jornalismo, perguntou-me ontem por que não escrevo de acordo com o "novo acordo ortográfico" (também chamado de AO90, em referência ao ano em que foi proposto). * * * "Acordos ortográficos" são maluquices da língua portuguesa. Nenhuma outra língua precisa disso; contudo, somente no século XX mudamos - por força de lei - quatro vezes a ortografia, sob o pretexto de "simplificá-la" ou de "uniformizá-la" entre os países lusófonos. A cada vez que isso ocorre, nossos jovens ficam mais distantes dos livros impressos no passado, que passam a oferecer dificuldades cada vez maiores para a leitura. Isso está fazendo com que a língua portuguesa se torne mais e mais uma língua sem profundidade histórica: os jovens conseguem ler somente o que foi editado nas últimas décadas - e perdem o universo de livros antigos que jamais serão reimpressos. O problema não é a transformação da língua: todas m

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