Pular para o conteúdo principal

Postagens

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Não muito mais adiante, Sócrates compara a uma droga ( phármakon ) os textos escritos que Fedro trouxe consigo. Esse phármakon , essa medicina, esse filtro, ao mesmo tempo remédio e veneno, já se introduz no corpo do discurso com toda sua ambivalência. Esse encanto, essa virtude de fascinação, essa potência de feitiço podem ser - alternadas ou simultaneamente - benéficas e maléficas" "Descrevendo o lógos como um zôon , Platão segue alguns retóricos e sofistas que, antes dele, opuseram à rigidez cadavérica da escritura a fala viva, regulando-se infalivelmente sobre as necessidades da situação atual, as expectativas e a demanda dos interlocutores presentes, farejando os lugares onde ela deve se produzir, fingindo curvar-se no momento em que ela se apresenta ao mesmo tempo persuasiva e constrangedora. O lógos , ser vivo e animado, é também um organismo engendrado" "Thot repete tudo na adição do suplemento: suprimindo o sol, ele é outro que o sol e o

O Ser Sem Representação*

Esse futuro nos iludira, mas não importava: amanhã correremos mais depressa, estenderemos mais os braços... E, uma bela manhã...                                                   F. Scoott Fitzgerald                   Ícones do corpo, espaço da não representação, o olho furado tem espaço no mundo virtual, ganha a expressão das cores em notas musicais, a tribal eletrônica Björk expande os sentidos dos meus dias, os tambores me levam para longe das máscaras, o Brasil virou uma sinfonia de arrepiar, um sonho fora do lugar... essa é a distância entre o devir e o isolamento absoluto de uma realidade neurotizada pela tentação do conhecimento único. O próprio movimento do que é feito os corpos, os sons e a imagem que vem da unidade do ser e do nada, e como bem disse Heidegger “...a realidade do mundo não pode consistir em um ser”. Eu olho no horizonte a tua partida a outro país, a tua arte ficou no caos do cotidiano, a inquietação das coisas é que dá ânimo ao sonho à sinfonia da

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Na Apologia, vê-se Sócrates se apresentar a seus juízes como o mestre do cuidado de si. É aquele que interpela as pessoas que passam e lhes diz: vos ocupais de vossas riquezas, e de vossa reputação e de vossas honras, mas não vos preocupais com vossa virtude e vossa alma. Sócrates é aquele que zela para que seus concidadãos 'cuidem de si mesmos'" "A filosofia está assimilada ao cuidado com a alma (...) e esse cuidado é uma tarefa que deve ser seguida ao longo de toda a vida" "(...) No Tratado da vida contemplativa, Fílon designa assim uma determinada prática dos Terapeutas como uma epimeléia da alma (...)" "Epicuro dizia: 'quando se é jovem não se deve hesitar em filosofar, e quando se é velho não se deve hesitar em filosofar. Nunca é cedo demais nem tarde demais para cuidar da alma''' "(...) não há outro fim nem outro termo a não ser estabelecer-se junto a si mesmo, 'residir em si mesmo' e a

O Estrangeiro*

Não suportamos os que são diferentes de nós porque têm a pele de cor diferente, falam uma língua que não compreendemos, porque comem rãs, macacos, porcos, alho, porque se fazem assim tão diferentes. Na vida, estamos sempre expostos ao trauma da diferença. Algumas vezes na existência, nos deparamos com situações que nos remetem ao olho do furacão, que nos deixam alienados de nossos quereres. Vamos vivendo nossa vida em compasso de espera, numa inércia de sentimentos, à mercê dos acontecimentos, onde o vazio afetivo se torna cotidiano. Habitamos nossa redoma de vidro, sem disposição ou coragem para correr riscos. Essa atitude de inércia desestabiliza nossas defesas, que foram construídas a ferro e fogo. Então, para desafiar nossos paradigmas, surge o estrangeiro, levantando simultaneamente o véu de nossa esperança e de nosso medo. Mas afinal, quem é esse estrangeiro? Consideramos estrangeiro, aquele indivíduo estranho a nós, não familiar, que nos instiga a reações incôm

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"(...) Pessoas que encontram partes preciosas de si não em outras pessoas, mas em livros (...)" "Tudo aquilo que julgamos 'entender bem', quer dizer, dominar e possuir, está fora do literário. A leitura de um grande livro mexe com o que temos de mais instável e de mais sensível, pois joga com o inacessível e o remoto" "Em um mundo obstruído por dogmas e slogans, a função da literatura não é concluir, mas desencadear. Não é fechar soluções, mas descortinar dúvidas e perguntas. Não é oferecer imagens prontas, mas vislumbrar novas maneiras de ver" "Mais do que fornecer respostas, o papel do crítico é o de construir perguntas. O crítico é um construtor de interpretações, que são inevitavelmente parciais, incompletas e transitórias" "Caeiro tem a consciência de que a existência é móvel, é fluída, é infiel. Daí sia aposta no valor da ignorância: é muito perigoso dar um nome ao que está sempre mudando" "De

Recomeços*

Desbravo caminhos que em minha alma acordam com os primeiros raios do sol. No caminho da vida peregrino sem cessar. Contemplo as tardes com saudades das manhãs. O fruto doce das alegrias se mistura ao verde das esperanças. Em cada canto um novo canto que na melodia da alma se faz sinfonia no silêncio dos meus tantos cantos. Alma peregrina que encontra nos portos seguros os mais belos horizontes. Assim é a vida... Um eterno amanhecer que nas tardes de outono sonham com as primaveras que hão de vir. No passado de pretéritos os amores sempre novos com saudades do passado. Sempre caminhar, se perdendo nos encontros e encontrando-se nas perdas. Viver assim como o caboclo que no chão lavra a terra de certezas da chuva sempre incerta. Olhar sem desanimar, e caminhar rumo ao meu avesso que tece esperanças com as estrelas que anunciam o presente das estações. Trilhar... a vida sem medo e mesmo com medo arriscar... Perder-se... Encontrar-se... E perder-se novamente... O que de mi

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Inexperiente perante os variados e infinitos sistemas verbais, crescia-me a certeza de que as palavras me desgovernavam, eram mais fortes que eu. Em especial porque significavam inúmeras coisas ao mesmo tempo, segundo os significados que lhes desse" "A inquietude do artista (...) é inesgotável" "(...) sendo a vida um argumento soberano, cabe-lhe, na narrativa, derramar poções ilusórias, farejar estéticas inovadoras, garantir à arte a sua dimensão real" "(...) Já que a narrativa tem ciência de que a vida, fora dos limites da invenção, perde o caráter transgressor e acomoda-se. E de que, longe da utopia, a controvertida modernidade dos sonhos desvanece-se" "Ancorados neste continente, somos tantos e todos ao mesmo tempo. Polissêmicos e solitários, unos e fragmentados, favorece-nos uma mestiçagem originária do caos do sangue e da memória" "(...) repertório existencial (...) tudo que diz respeito aos que poeti

Poética clandestina*

                                                                                                                                           Uma profecia de caráter excepcional recai sobre alguns escolhidos, parecem surgir de uma cepa rara, sujeitos a descrever a saga do personagem marginal. Estruturados para surgir como transgressão continuada, ser iconoclastas e seus contrários, quase ao mesmo tempo, desconstroem a certeza de uma só verdade para todas as coisas.    A atitude inesperada de toda razão oferece a perspectiva plural na forma de poesia, filosofia, arte, subversão estética ao mundo instituído. No caso da inquietude filosófica, antes de virar técnica acadêmica, é a concepção do eu como outros que retorna na inspiração libertária dos movimentos da irreflexão. Um cavalheiro andante em busca de sua tribo encontra Adão e Eva no paraíso da singularidade. A palavra realiza uma poética das ruas. Seu caráter de profanação reivindica rituais de iniciados. Os enredos do mundo

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Na grande sequência que vai de Hermas a Goethe, passando por Dante, ao longo de quase dois mil anos, encontramos sempre a experiência amorosa pessoal, não somente acrescentada, como também subordinada a uma grande experiência visionária" "A anomalia mental também pode ser uma espécie de sanidade mental, inconcebível para a inteligência mediana ou um poder espiritual superior" "(...) Todo ser criador é uma dualidade ou uma síntese de qualidades paradoxais (...)" "Por outro lado, os materiais fornecidos pelos psicóticos são ricos e de um alcance significativo que apenas poderemos encontrar nas produções dos gênios" "É aí que está o significado social da obra de arte: ela trabalha continuamente na educação do espírito da época, pois traz a tona aquelas formas das quais a época mais necessita (...)" "O homem normal consegue suportar a tendência geral sem se prejudicar; mas o homem que caminha por atalhos e des

Uma tal senhora Beauvoir*

“É porque não aceito as fugas e as mentiras que me acusam de pessimista...”                                      Simone de Beauvoir O que permanece escrito e não compreendido não é mais um hieróglifo, não participa mais do histórico lastro da linguística que identificava os significados através da escrita. Hoje, podemos dizer que o não pressuposto ato de ver e não identificar é mais um sintoma viral do século XXI.  O que chamo de burrice proposital, ou então, do silêncio hipócrita das direitas e dos empedernidos esquerdistas que acompanham o som dos imbecis. É uma mistura nonsense que anda solta nas páginas dos obsoletos jornais, das redes sociais, que percorre os planaltos, praias, palcos até moldar o conformismo da opinião pública. Ontem lendo um velho livro, velho, porque foi escrito por uma senhora que marcou demais a cultura ocidental com suas ideias inovadoras, libertadora e provocante em certo momento histórico. Para que agora seja relida, consigo perceber, a

Fragmentos Filosóficos, Delirantes*

"Eu, alquimista de mim mesmo. Sou um homem que se devora ? Não, é que vivo em eterna mutação, com novas adaptações a meu renovado viver e nunca chego ao fim de cada um dos modos de existir. Vivo de esboços não acabados e vacilantes. Mas equilibro-me como posso entre mim e eu, entre mim e os homens, entre mim e o Deus" "Para começo de conversa, afianço que só se vive, vida mesmo, quando se aprende que até a mentira é verdade (...)" "Nunca vi uma coisa mais solitária do que ter uma ideia original e nova. Não se é apoiado por ninguém e mal se acredita em si mesmo. Quanto mais nova a sensação-ideia, mais perto se parece estar da solidão da loucura" "E se eu falar, que eu me permita ser descontínuo: não tenho compromisso comigo. Eu vou me acumulando, me acumulando, me acumulando - até que não caibo em mim e estouro em palavras" "Luto não contra os que compram e vendem apartamentos e carros e procuram se casar e ter filhos mas

Reflexões*

Embora seja apenas a passagem de um dia para o outro, como ocorre em qualquer época, a virada do ano pode ser bem aproveitada. Na proximidade dessa passagem, podemos refletir sobre o ano que segue para o encerramento, relembrando realizações e perdas, acertos e erros, bem como projetos conquistados, interrompidos, a serem retomados e criados. Também é um período favorável para pensar as relações com familiares, amigos, colegas de trabalho etc. Há, inclusive, a questão da saúde. Um bem que costumamos valorizar mais quando nos falta em vez de cultivá-lo enquanto o temos. Algo que considero bom é me desfazer do que não uso (ou nunca usei) mais. Jogando no lixo o que não presta e doando o que está em bom estado ou até novo. Mas é ilusório pensar que tudo muda no primeiro dia de janeiro. Muitos estão até de ressaca. Ninguém age bem neste estado. A mudança substancial é construída pela consistência. Todo hábito requer tempo. Passada a empolgação dos primeiros

Visitas