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Fragmentos Filosóficos, Devaneios, e algo mais*

"(...) Platão pôs-se a inventar uma prosa ágil, despojada das fossilizantes leis da retórica, uma prosa que unisse a sedução da poesia e a espontaneidade da fala, uma prosa que tivesse a gravidade da tragédia e a malícia da comédia, uma prosa que soubesse fixar rigorosamente as etapas para o avanço dos argumentos (...) Foi assim que a filosofia oral se tornou escrita (...)"

"Platão substitui a memória pelo texto escrito, ambíguo, lacunoso, feito para refletir e não para recordar (...) O texto platônico, infiel como registro literal, estimula a reflexão, reavivando a voz cáustica, irônica, que atenienses queriam para sempre silenciada. A escrita não aparece aqui como capa de ocultos sentidos, mas como fonte de intermináveis significações (...) Na escrita de Platão, prosa e poesia confluem (...)"

"(...)Platão indica vários caminhos e não se fixa em nenhum. Definido está o filósofo, o que incessantemente busca"

"(...) Andamos no território do discurso. Tanto o erro absoluto como a verdade absoluta habitam fora das fronteiras do dizer. Ambos são indizíveis (...)"

"(...) Colocados em relação dialética, os discursos desalojam a exposição retilínea com a força da investigação. A dialética propõe o discurso plural (...)"

"(...) O destino do filósofo é mover-se, porém, entre as sombras da caverna, embora iluminado"

"Para Heráclito, a própria natureza, articulada pelo discurso (logos), garante a harmonia dos contrários, sendo o arco e a lira metáforas da harmonia antitética. Ao arco se recorre na guerra, a lira soa em momentos de paz. Como todas as exclusões absolutas, também esta não é mais do que aparente. Os soldados manejam o arco para alcançar a paz, ao passo que os poetas celebram, ao som da lira, façanhas guerreiras, o que atesta a inquebrantável harmonia dos contrários (...)"

"(...) No início, em vez de dois sexos, havia três. O terceiro sexo, o andrógino, era a fusão dos outros dois. O desprezo que afeta agora pessoas de sexo indefinido não o molestava. Esférica era a forma das pessoas de então (...) Dos três sexos, o masculino era o filho do Sol, o feminino filho da Terra, o andrógino era filho da Lua, como ela, inconstante (...)"

"(...) Não poderia imaginar o que o excede antes de apalpar as fronteiras que lhe vedam o passo. A ferida é limite e chamado para ir além, ao encontro do Outro e do que nos separa uns dos outros (...)"

"(...) A dialética, invadindo a cidade com furor dionisíaco, fustiga os jovens nas praças, desestabiliza os monumentos verbais esculpidos para o enlevo de reuniões cultas. Sócrates, denunciando o saber como acomodado sono de ignorantes, dissemina a loucura nos fortins da certeza (...)"

"(...) Fiel às tradições helênicas, tudo o que a natureza generosamente oferece é sagrado, também a loucura (...)"

*Donaldo Schuler in "Eros: Dialética e Retórica". EDUSP. SP. 2001. 

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