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Poéticas da irrealidade*



                                               
                                                    

Os eventos do cotidiano ensaiam um convite - muitas vezes incompreendido - para desatar os nós das miragens. São pretextos aos rascunhos da inspiração singular. Ao inspecionar as vizinhanças do mundo conhecido, essas lonjuras de aspecto intocável, se insinuam na reapresentação das horas. Sua busca, ao ser algo por vir, cogita sobre as terras de ninguém.

Uma cogitação qualquer, pode introduzir a especulação sobre a natureza dessas outras verdades, inicialmente descartadas pelo discurso consagrado. O roteiro por onde esses ensaios acontecem possuem um território de excelência. Assim os devaneios com as ruas de Paris, Lisboa, Moscou ou Porto Alegre, podem significar a nascente obtusa para algo inesperado.   

 As poéticas da irrealidade cuidam das margens do que se sabe. Sua mensagem de caráter flutuante sugere uma fenomenologia das errâncias. Esse além de si mesmo, que existe em cada um, oferece seus traços ao superar o chão de onde partiu. Aprecia se expressar como transbordamento, ampliando seus impróprios limites.

Seu dizer emancipa, reinventa os arrabaldes do léxico conhecido. A constatação de ter diante de si, um território a ser explorado, tendo como método, além de uma introspecção bem trabalhada, tudo aquilo a se apresentar ao olho nu de suas possibilidades.

Aqui se vislumbra a perspectiva de um ânimo precursor. Sinto que homens como: Platão, Aspázia de Mileto, Aristóteles, Shakespeare, Nietzsche, Marie Curie, Dante, Valentina Tereshkova, Einstein, Joana D'Arc, Fernando Pessoa..., frequentaram essa fonte de inéditos.

Uma das competências para visualizar e traduzir as conexões entre diferentes jogos de linguagem é o saber aprendiz, que se inicia sabendo que não sabe. Outro aspecto é sentir, perceber, intuir seu ser incomum, enquanto se esboça como dúvida, contradição, paradoxo com aquilo que se conhece.

Esse universo aprecia guardar seus segredos para alguém com habilidades para decifrá-lo. Sua descrição se apresenta na página em branco diante do olhar. Nessa subjetividade desconsiderada pelos princípios de verdade - um ponto em comum com os conteúdos acessados -, desdobra-se uma pluralidade silenciosa de anúncios, por onde o mundo conhecido amplia seus horizontes.

Com as poéticas da irrealidade se vislumbra uma matéria-prima em devir. Como algo a perder de vista, seus apontamentos costumam reinventar o velho mapa. Ao filósofo clínico cabe investigar as origens, observar os deslocamentos, compartilhar-se por esses discursos existenciais, como uma via de acesso ás quimeras da realidade, um pouco antes de se tornar.

*Hélio Strassburger é Filósofo Clínico e Professor. Como educador atuou desde o ensino fundamental à pós-graduação. Foi professor de Filosofia em escolas públicas, particulares, universidades, diretor geral do Instituto Packter por 17 anos. Trabalha há 40 anos priorizando as instituições de periferia, marginais, como: aulas e atendimentos em morros, asilos, hospitais gerais e psiquiátricos, nas cidades onde tem residido, levando a mensagem de uma Filosofia Clínica libertária.

Atualmente, com mais de 30.000 horas de clínica, dentre outras atividades, coordena a Casa da Filosofia Clínica, atende em sua clínica particular e participa de eventos como: Cafés Filosóficos Clínicos, Seminários, Colóquios, Congressos nacionais e internacionais.

Autor de obras como: ‘Poéticas da singularidade’ pela E-papers/RJ; ‘Diálogos com a lógica dos excessos’ pela E-papers/RJ; ‘Pérolas Imperfeitas – apontamentos sobre as lógicas do improvável’; pela editora Sulina em Porto Alegre/RS; ‘A palavra fora de si – anotações de filosofia clínica e linguagem’, pela editora Multifoco/RJ.  

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