"Hoje amanheci escuro, sem palavras... seduz-me este exílio! (estou me esperando)"
Djandre Rolim - Poeta Cigano
Existe uma fonte
extraordinária em que a obra de arte decaída se encontra. Nela é visível o
apelo silencioso das raridades. Nalgumas pode se notar a exuberância dos
contornos, em outras a raiz mergulha na terra em busca de proteção. Ainda
àquelas a lançar sementes na brisa passageira.
Quando muito próximo
pode significar conviver com os espinhos uma da outra. Os sinais descrevem
nuances de uma estória em que antes e agora se integram, fazendo a pétala
renascer, se alternando nas estações. Sua essência plural realiza uma poesia
sem palavras nesses espelhos da natureza.
Existem jardins com uma
história de descuidos, maltratados uma vida inteira. Ao vivenciar alguma forma
de atenção, carinho, perseguem o subsolo de si mesmos. Nesse sentido,
desacostumados à luz do sol, num movimento de quase semente, se refugiam nas
sombras conhecidas, cercam-se de muros, paredes de difícil acesso.
O dom da jardinagem
conhece a linguagem ritual de morte e renascimento. Esses movimentos deixam
rastros sem pegadas, reivindicando cuidados, dedicação. Um lugar onde o
jardineiro nascido dos jardins exerce sua poética, numa fluência singular da
mão com a terra, a água, o ar.
Sua percepção atenta
exercita habilidades de aprendiz. O diálogo com os brotos frágeis, as folhas maltratadas
e a raiz tênue pode significar vida às sementes desmerecidas. A escolha da
matéria-prima aos medicamentos, o afago carinhoso das manhãs, os tempos e
momentos de cada planta podem florescer a vida nova.
Nessa estética a céu
aberto brotam rosas, dálias, gerânios, ipês, flamboyants, num solo cultivado
pelo encontro do artesão com seu barro. Nesse paraíso onde a lagarta se faz
borboleta, existe uma contraditória harmonia, onde uns completam os outros.
Ao semeador da fauna e
da flora o pretexto se anuncia em cada broto desconsiderado. Talvez a queda da
folha, flor ou fruto, ao fecundar um pedaço de chão, permita ao mago da
natureza o encanto transformador de sua magia em um belo jardim.
*Hélio Strassburger in
"Pérolas Imperfeitas - Apontamentos sobre as lógicas do improvável".
Ed. Sulina. Porto legre/RS. 2012.
**O autor trabalha há
40 anos com instituições de periferia, marginais, como: aulas e atendimentos em morros,
asilos, hospitais gerais e psiquiátricos, associações comunitárias, dentre
outros espaços, nas cidades onde tem residido, levando a mensagem de uma Filosofia
Clínica libertária.
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