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Anotações, Reflexões, Percepções de um Filósofo Clínico*



Vejo muitos - inclusive professores! - atribuindo ao Paulo Freire a responsabilidade pelo estado lastimável da educação no Brasil.

Para problemas incrivelmente difíceis, a mente simplória costuma encontrar causas milagrosamente fáceis - e espetacularmente equivocadas.

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Não foi ontem que o Lima Barreto ridicularizou a cultura bacharelesca brasileira: "Triste Fim de Policarpo Quaresma" é de 1915. O Richard Feynman, Nobel de Física, desnudou a farsa do modelo pedagógico brasileiro quase vinte anos antes da "Pedagogia do Oprimido", que é de 1968.

Amigos, a educação no nosso país é ruim demais há muito, muito tempo. O Paulo Freire não pode ser responsabilizado por problemas que existiam décadas antes da sua obra.

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Uma das causas da miséria da educação brasileira é a miséria da cultura da elite nacional. O brasileiro é apaixonado pelos sinais exteriores de status, inclusive no plano intelectual. O objetivo da educação, entre nós, nunca foi a aquisição do conhecimento, mas do diploma.

Surge daí a tradição do "estudar para a prova", das musiquinhas de decoreba, dos cursinhos preparatórios: saber os macetes para tirar boas notas nas avaliações importa mais do que verdadeiramente saber.

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Outra das causas da nossa pobreza educacional é a ausência completa de um projeto de Educação: jamais os nossos governantes e gestores do primeiro escalão se perguntaram por que educar. Nunca se puseram a questão: "quem nós queremos que as nossas crianças sejam aos dezoito anos? o que queremos que elas saibam, o que queremos que elas saibam fazer?".

O resultado é que o nosso currículo escolar é uma colcha de retalhos sem nenhum propósito que macaqueia desastradamente os currículos de outros países.

Daí vem uma surreal conseqüência: a única meta de todo o ensino básico se torna o vestibular, um vestibular com um programa duas vezes absurdo - absurdo por sua extensão alucinada e absurdo por sua desconexão com a vida do espírito e da sociedade.

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Essas sim, e não o Paulo Freire, são duas das causas profundas do desastre cotidiano das nossas escolas.

*Prof. Dr. Gustavo Bertoche
Filósofo. Escritor. Musicista. Filósofo Clínico
Teresópolis/RJ

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