Vejo muitos - inclusive
professores! - atribuindo ao Paulo Freire a responsabilidade pelo estado
lastimável da educação no Brasil.
Para problemas
incrivelmente difíceis, a mente simplória costuma encontrar causas
milagrosamente fáceis - e espetacularmente equivocadas.
* * *
Não foi ontem que o Lima
Barreto ridicularizou a cultura bacharelesca brasileira: "Triste Fim de
Policarpo Quaresma" é de 1915. O Richard Feynman, Nobel de Física,
desnudou a farsa do modelo pedagógico brasileiro quase vinte anos antes da "Pedagogia
do Oprimido", que é de 1968.
Amigos, a educação no
nosso país é ruim demais há muito, muito tempo. O Paulo Freire não pode ser
responsabilizado por problemas que existiam décadas antes da sua obra.
* * *
Uma das causas da
miséria da educação brasileira é a miséria da cultura da elite nacional. O
brasileiro é apaixonado pelos sinais exteriores de status, inclusive no plano
intelectual. O objetivo da educação, entre nós, nunca foi a aquisição do
conhecimento, mas do diploma.
Surge daí a tradição do
"estudar para a prova", das musiquinhas de decoreba, dos cursinhos
preparatórios: saber os macetes para tirar boas notas nas avaliações importa
mais do que verdadeiramente saber.
* * *
Outra das causas da nossa
pobreza educacional é a ausência completa de um projeto de Educação: jamais os
nossos governantes e gestores do primeiro escalão se perguntaram por que
educar. Nunca se puseram a questão: "quem nós queremos que as nossas
crianças sejam aos dezoito anos? o que queremos que elas saibam, o que queremos
que elas saibam fazer?".
O resultado é que o nosso
currículo escolar é uma colcha de retalhos sem nenhum propósito que macaqueia
desastradamente os currículos de outros países.
Daí vem uma surreal
conseqüência: a única meta de todo o ensino básico se torna o vestibular, um
vestibular com um programa duas vezes absurdo - absurdo por sua extensão
alucinada e absurdo por sua desconexão com a vida do espírito e da sociedade.
* * *
Essas sim, e não o Paulo
Freire, são duas das causas profundas do desastre cotidiano das nossas escolas.
*Prof. Dr. Gustavo
Bertoche
Filósofo. Escritor.
Musicista. Filósofo Clínico
Teresópolis/RJ
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