"Transeuntes eternos por nós mesmos, não há paisagem senão o que somos. Nada possuímos, porque nem a nós possuímos. Nada temos porque nada somos. Que mãos estenderei para que universo? O universo não é meu: sou eu"
"Qualquer coisa, conforme se considera, é um assombro ou um estorvo, um tudo ou um nada, um caminho ou uma preocupação. Considerá-la cada vez de um modo diferente é renová-la, multiplicá-la por si mesma. É por isso que o espírito contemplativo que nunca saiu da sua aldeia tem contudo à sua ordem o universo inteiro. Numa cela ou num deserto está o infinito. |Numa pedra dorme-se cosmicamente"
"Há metáforas que são mais reais do que a gente que anda na rua. Há imagens nos recantos de livros que vivem mais nitidamente que muito homem e muita mulher"
"Posso imaginar-me tudo, porque não sou nada. Se fosse alguma coisa, não poderia imaginar. O ajudante de guarda-livros pode sonhar-se imperador romano; o Rei de Inglaterra não o pode fazer, porque o Rei de Inglaterra está privado de ser, em sonhos, outro rei que não o rei que é. A sua realidade não o deixa sentir"
"(...) felizmente para a humanidade, cada homem é só quem é, sendo dado ao gênio, apenas, o ser mais alguns outros"
"Deus é o existirmos e isto não ser tudo"
"O que não temos, ou não ousamos, ou não conseguimos, podemos possuí-lo em sonho, e é com esse sonho que fazemos arte"
"(...) esse episódio da imaginação a que chamamos realidade"
"Vivemos todos neste mundo, a bordo de um navio saído de um porto que desconhecemos para um porto que ignoramos; devemos ter uns para os outros uma amabilidade de viagem"
"Considero-me feliz por não ter já parentes. Não me vejo assim na obrigação, que inevitavelmente me pesaria, de ter que amar alguém"
*Fernando Pessoas in "Livro do Desassossego". Ed. Cia de Bolso. SP. 2014.
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