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Fragmentos Filosóficos, Devaneios, e algo mais*


"(...) Daí a função de uma arte aberta como metáfora epistemológica: num mundo em que a descontinuidade dos fenômenos pôs em crise a possibilidade de uma imagem unitária e definitiva, esta sugere um modo de ver aquilo que se vive, e vendo-o, aceitá-lo, integrá-lo em nossa sensibilidade. Uma obra aberta enfrenta plenamente a tarefa de oferecer uma imagem da descontinuidade. Ela se coloca como mediadora entre a abstrata categoria da metodologia científica e a matéria viva de nossa sensibilidade; quase como uma espécie de esquema transcendental que nos permite compreender novos aspectos do mundo"

"A abertura, por seu lado, é garantia de um tipo de fruição particularmente rico e surpreendente, que nossa civilização procura alcançar como valor dos mais preciosos, pois todos os dados de nossa cultura nos induzem a conceber, sentir, e portanto ver, o mundo segundo a categoria da possibilidade"

"Obra Aberta como proposta de um campo de possibilidades interpretativas, como configuração de estímulos dotados de uma substancial indeterminação, de maneira a induzir o fruidor a uma série de leituras sempre variáveis; estrutura, enfim, como constelação de elementos que se prestam a diversas relações recíprocas"

"(...) Temos poucos motivos para reputar universalmente superior o modelo cultural ocidental moderno, mas um deles é justamente sua plasticidade, sua capacidade de responder aos desafios das circunstâncias pela elaboração contínua de novos módulos de adaptação e novas justificações da experiência (aos quais a sensibilidade individual e coletiva se adapta, embora com maior ou menor tempestividade)"

"(...) de que modo a arte de todos os tempos aparece como provocação de experiências propositadamente incompleta, interrompidas de chofre para suscitar, graças a uma expectativa frustrada, nossa tendência natural ao completamento"

"Entre a proposição de uma pluralidade de mundos formais e a proposição do caos indiferenciado, desprovido de qualquer possibilidade de fruição estética, a distância é curta: somente uma dialética pendular pode salvar o compositor de obras abertas"

"Ordem e desordem são conceitos relativos; somos ordenados em relação a uma desordem anterior e desordenados em relação a uma ordem posterior, exatamente como somos jovens em relação a nosso pai e velhos em relação a nosso filho, libertinos em relação a um sistema de regras morais e moralistas em relação a outro mais dúctil"

"(...) um aspecto peculiar da obra, que a desvende inteira sob uma nova luz, deve esperar o ponto de vista capaz de captá-lo e projetá-lo"

"(...) um complexo interagir de forças, uma constelação de eventos, um dinamismo de estrutura; a noção de possibilidade é uma noção filosófica que reflete toda uma tendência da ciência contemporânea, o abandono de uma visão estática e silogística da ordem, a abertura para uma plasticidade de decisões pessoais e para uma situacionalidade e historicidade dos valores"

*Umberto Eco in "Obra Aberta". Ed. Perspectiva/SP. 2005.   

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