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Fragmentos Filosóficos, Devaneios, e algo mais***


"(...) Em primeiro lugar, não há diagnose psiquiátrica; portanto, não se dá o primeiro passo para a invalidação das pessoas. Em termos socialmente eficazes, o verdadeiro significado da diagnose é o de transpassar com uma espada o coração da gnose. É como que o assassinato da possibilidade de se conhecer uma pessoa, perpetrado ao se deslocar a realidade dessa pessoa para o limbo da pseudo-objetividade social (...)"

"(...) Rotular alguém de 'esquizofrênico', 'paranóico', 'psicopata', 'pervertido sexual', 'viciado', 'alcoólatra', é como disparar mísseis carregados de bombas contra uma cidade qualquer (...) O fato de não se recorrer, nessas comunidades, à falsa categorização das pessoas é pré-condicionado pela des-hierarquização do grupo (...)"

"(...) A saída para esta situação me parece ser a conscientização de que, talvez, para libertar os outros, o melhor que temos a fazer é libertar-nos a nós mesmos (...)"

"(...) Toda linguagem verbal é impositiva de uma forma que a comunicação não-verbal não é"

"(...) a família é especialista em estabelecer papéis para os seus membros, mais do que em criar as condições para cada um assumir livremente a sua identidade (...)"

"(...) Na realidade, o que basicamente se ensina à criança não é como sobreviver na sociedade, mas como submeter-se a ela"

"(...) Para o estado burguês, se isto acontece em larga escala, a terapia torna-se perigosa e altamente subversiva, porque acena com formas de vida social radicalmente novas. Por ora, todavia, basta dizer que toda criança, antes que a doutrinação da família ultrapasse um certo ponto, e antes que a doutrinação da escola primária comece é, embrionariamente pelo menos, um artista, um visionário e um revolucionário (...)"

"(...) a família instila nas crianças um elaborado sistema de tabus. À semelhança do que ocorre com o ensinamento em geral de controles sociais, isto se consegue pela implantação do sentimento de culpa na pessoa (...)"

"(...) a única saída do indivíduo talvez seja cometer uma série de atos que o levem a ser designado esquizofrênico e transferido para esta réplica da família que é o hospício (...)"

"(...) pela primeira vez tinha a noção de que não era mais o menino da mamãe, mas, de fato, a sua própria pessoa. A questão é que Felipe não podia dizer uma única palavra sobre a sua experiência pessoal a qualquer dos membros da família que não fosse distorcida por eles ou transformada em piadinha sobre o seu menino (...)"

"Se o indivíduo não descobre a própria autonomia (...) corre o risco de enlouquecer (...) ou de desistir e se tornar um cidadão normal; ou pode abrir o seu caminho para a liberdade pela elaboração das suas relações pessoais (...) Em todo caso, é preciso sair de casa um dia. Talvez quanto mais cedo melhor (...)"

"Na prática, 'criar' uma criança é como abater uma pessoa; no mesmo sentido, a educação aliena a pessoa de si mesma (..) 

"Depois das instituições de educação, a psiquiatria é o terceiro bastião de defesa da família contra a autonomia de seus membros - a psiquiatria, bem entendido, ao lado das escolas especiais, das prisões e de uma multiplicidade de situações, mais discretas, de rejeição (...)"

"(...) a família assim socialmente metamorfoseada reduz ao anonimato as pessoas que trabalham ou vivem juntas em qualquer estrutura institucional; o que existe é uma justaposição de pessoas como numa fila de ônibus, disfarçada em agrupamento amigável (...)"

*David Cooper in "A Morte da Família". Ed. Martins Fontes. SP. 1994.   

**David G. Cooper foi um psiquiatra sul-africano, notável teórico e líder do movimento anti-psiquiatria, ao lado de R. D. Laing, Thomas Szasz e Michel Foucault. Cooper graduou-se pela Universidade da Cidade do Cabo em 1955. Mudou-se para Londres, onde trabalhou em muitos hospitais e dirigiu uma unidade experimental para jovens esquizofrênicos chamada Villa 21. Em 1965, envolveu-se com Laing e outros médicos e estabeleceu a chamada Philadelphia Association. Um "marxista existencialista", Cooper deixou a Philadelphia Association nos anos 70, em um desacordo sobre o crescente interesse da associação em espiritualismo, em vez de política.

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