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Fragmentos Filosóficos, Delirantes*


"(...) Hladik preconizava o verso porque ele impede que os espectadores se esqueçam da irrealidade que é a condição da arte"

"Dezenove anos tinha vivido como quem sonha: olhava sem ver, ouvia sem ouvir, esquecia- se de tudo, de quase tudo. Ao cair, perdeu o conhecimento; quando o recobrou, o presente era quase intolerável de tão rico e tão nítido, e assim também as memórias mais antigas e mais triviais"

"Talvez Schopenhauer tenha razão: eu sou os outros, qualquer homem é todos os homens. Shakespeare é de algum modo o miserável John Vincent Moon (...)"

"As razões que pode ter um homem para abominar ou para querer bem a outrem são infinitas"

"Em todas as ficções, cada vez que um homem se defronta com diversas alternativas, opta por uma e elimina as demais; na do quase inextricável Ts'ui Pên, opta, simultaneamente, por todas. Cria, assim, diversos futuros, diversos tempos, que também proliferam e se bifurcam" 

"(...) Depois refleti que todas as coisas sempre acontecem precisamente a alguém, precisamente agora. Séculos de séculos e só no presente ocorrem os fatos"

"(...) um bibliotecário de gênio descobrisse a lei fundamental da Biblioteca. Esse pensador observou que todos os livros, por diversos que sejam, constam de elementos iguais: o espaço, o ponto, a vírgula, as vinte e duas letras do alfabeto. Também alegou um fato que todos os viajantes confirmaram: 'Não há, na vasta Biblioteca, dois livros idênticos"

"(...) Eu afirmo que a Biblioteca é interminável"

"Lembrando Pierre Menard: 'Pensar, analisar, inventar são atos anômalos, são a respiração normal da inteligência. Glorificar o ocasional cumprimento dessa função, entesourar antigos e alheios pensamentos, recordar com incrédula estupefação o que o doctor universalis pensou, é confessar nossa languidez ou nossa barbárie. Todo homem deve ser capaz de todas as ideias e entendo que no futuro será'" 

"(...) Inútil responder que a realidade também é ordenada. Talvez seja, mas de acordo com leis divinas - traduzo: com leis inumanas - que nunca chegamos a perceber inteiramente"

*Jorge Luis Borges in "Ficções". Ed. Cia das Letras. SP. 2007.

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